A 6ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, por unanimidade negou provimento ao recurso onde a recorrente, inconformada com a sentença que rejeitou os pedidos formulados na petição inicial, interpõe recurso ordinário, pugnando pelo reconhecimento da doença ocupacional/estabilidade provisória e o pagamento de indenizações por danos morais e materiais
A reclamante alegou ter sido acometido de doença do trabalho, submetido a tratamento cirúrgico em 14.07.2020, ficando 90 dias afastada do labor, recebendo auxílio-doença. Relata ter desenvolvido hérnia inguinal direita, em função das diversas atividades com considerável esforço físico, em especial, pela necessidade de recolher nas escadas todos os sacos de lixos dos condôminos.
Dessa forma, pretendia o reconhecimento de doença profissional, com a condenação da reclamada no pagamento de indenizações por danos morais e materiais, bem como indenização do período de estabilidade acidentária.
Em defesa, a demandada negou a vinculação da doença que acometeu a autora e o labor realizado, bem como qualquer conduta culposa ou dolosa como causadora de alguma enfermidade da reclamante, sustentando o caráter não acidentário e degenerativo das lesões apresentadas, bem como a inexistência de incapacidade atual.
A sentença julgou a pretensão do autor fundamentada da seguinte forma:
Os documentos apresentados pela autora comprovam a existência de hérnia na região inguinal direita, entretanto, há dúvidas acerca de sua relação com o trabalho desenvolvido na reclamada, conforme se pode ver da conclusão do perito judicial.
O perito médico, em sua conclusão da perícia realizada (ID. 932113f), aduziu que: “muito embora existam diversos fatores que podem atuar diretamente para a ocorrência de hérnias inguinais, muitos deles de difícil apuração, considera-se que o manuseio dos pesos descritos em seu labor, com transporte de sacos de lixo pesados pelas escadarias do prédio, sem o uso de elevador, se comprovado, será enquadrado como uma causa concorrente (concausa) para o aparecimento/agravamento da enfermidade, a qual não foi descrita quando da admissão. Por ocasião desta avaliação médica pericial a autora já havia realizado a cirurgia para a correção da hérnia e não apresentava sinais de recidiva da enfermidade, mantendo-se apta ao labor e à execução das atividades da vida diária (AVD) de forma plena e sem a necessidade de auxílio de terceiros. Inclusive, seguia trabalhando na data da perícia.”
Diante da conclusão do perito, resta analisar a comprovação do habitual carregamento de peso pelo reclamante no desempenho de suas atividades diárias, para corroborar a possível concausa. Passo a análise da prova oral.
A reclamante, em depoimento pessoal, afirmou: “foi diagnosticada com hérnia em dezembro de 2019; fez a cirurgia no dia 06 de julho de 2020; … fora da temporada fazia o recolhimento do lixo uma vez por dia e na temporada 2x, descendo as escadas com o lixo porque não podia usar o elevador com os tais; um ano depois que a autora estava lá foi lhe dado um carrinho e aí poderia descer por elevador”.
Assim, constata-se que na época do surgimento da hérnia na região inguinal direita a autora não estava realizando trabalho com sobrecarga, não podendo ser reconhecido o nexo de concausalidade.
A hérnia, conforme indicado pelo perito, é “uma doença de origem multicausal” e está relacionada “com predisposição individual, genética, hereditariedade, alterações nutricionais, obesidade, doenças metabólicas, alterações anatômicas, esforços físicos, enfraquecimento muscular pelo envelhecimento natural do organismo”.
Assim, tanto a prática de exercício físico pela autora (corrida) como o histórico de obesidade e tabagismo podem ter contribuído para sua a ocorrência.
Dessarte, tenho por não comprovado o nexo de concausalidade entre a patologia e o labor na reclamada.
Assim sendo, indevidos os pedidos de indenizações decorrentes da alegada doença ocupacional, porquanto não correlacionada com o labor desenvolvido na reclamada.
A Autora recorreu da sentença alegando que fazia o recolhimento dos lixos de vinte e dois apartamentos pelas escadas, carregando no braço os sacos de lixo, esforço que aumentava na temporada de verão.
Pontuou que os fatos alegados foram confirmados pelo depoimento pessoal e pelas declarações de sua testemunha, sendo que o condomínio não produziu prova, nem sequer desconstituiu as que se encontram nos autos.
Alegou que a decisão a quo está equivocada, pois “se deu por entender que o lapso temporal entre o comprovado esforço realizado pela RECORRENTE no recolhimento dos lixos até o surgimento da doença era considerável e por isso não haveria o nexo concausal necessário”.
Ponderou o seguinte: ainda que “tenha informado em seu depoimento pessoal que a doença surgiu apenas em dezembro/2019, ao se analisar os documentos pode-se confirmar que, na realidade, surgiu muito antes em agosto/2019” (cita o receituário juntado aos autos); e que a divergência de datas desserve para desconstituir a prova documental.
Refere que o laudo foi claro ao afirmar que a doença decorre de esforço físico, estando comprovada a doença laborativa, não sendo possível justificar o esforço em relação a maratona que participou.
Pediu a reforma da sentença para que se reconheça a doença ocupacional e a estabilidade provisória, condenando-se o recorrido no pagamento das indenizações decorrentes; também requer o pagamento dos danos morais e materiais suportados e pelos quais deve ser indenizada. Por fim, havendo a reforma da sentença, pede a condenação do réu nas custas e nos honorários de sucumbência.
O relator votou do seguinte modo:
Muito embora o órgão judiciário não esteja vinculado ao laudo pericial, a invalidação de laudo técnico judicial tem de se basear em prova existente nos autos, de índole igualmente técnica, que se demonstre capaz de desconstituir a conclusão exposta pelo profissional nomeado pelo Juízo, sobretudo quando se trata de verba que exige a produção de prova estritamente técnica, como é o caso dos pleitos exordiais em tela, fundamentados na existência de doença supostamente decorrente do trabalho.
Logo, quando não produzida prova capaz de infirmá-la, deve ser convalidada a conclusão exposta no laudo pericial realizado por determinação do Juízo.
Note-se que o perito listou outros fatores causadores da doença, quais sejam: “A tosse, o tabagismo, a obesidade, a história familiar, a idade avançada, a constipação intestinal, a desnutrição e a área de atividade ocupacional estão entre os fatores de risco para a ocorrência de hérnia de parede abdominal”.
Registre-se, ainda, que o documento mencionado no recurso (juntado ao autos), foi datado em setembro de 2019, mesmo mês em que a autora correu uma maratona de 5 km (segundo informa em seu depoimento pessoal), sendo que “a prática de exercícios físicos (como maratonas, trilhas, escaladas em pedras), sem o acompanhamento de profissional habilitado, pode ocasionar no diagnóstico de hérnia inguinal”, conforme confirmado pelo perito ao responder o quesito ‘8’ do réu.
Ou seja, em que pese a argumentação da recorrente, tais argumentos desservem para modificar a sentença, revelando-se incabível decidir de forma diversa do Juízo de origem, devendo ser convalidada sua conclusão quanto à não comprovação do nexo de concausalidade entre a patologia da autora e o labor desenvolvido na reclamada.
Ante exposto, mantenho a sentença, por seus próprios e jurídicos fundamentos, acrescidos das presentes razões de decidir.
Ementa
RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. DOENÇA OCUPACIONAL. A pretensão indenizatória decorrente de acidente do trabalho ou doença ocupacional a ele equiparada condiciona-se à comprovação simultânea dos seguintes pressupostos (teoria da responsabilização civil subjetiva): a ocorrência de um dano efetivo, o nexo causal/concausal entre o ato praticado e o dano, e a culpa do agente. <p
(TRT-12 – ROT: 00013590620205120040, Relator: ROBERTO BASILONE LEITE, 6ª Câmara, Data de Publicação: 08/11/2022)
Fonte: TRT 12ª Região